O centro de estudos jurídicos universitários fora a Universidade de Bolonha. O primeiro documento histórico que denota sua aparição é a Authentica Habita, de 1158, através da qual Frederico Barba-Ruiva concede aos estudantes estrangeiros e professores prerrogativas para que pudessem habitar a cidade e frequentar as aulas com tranquilidade.
Originariamente, os estudantes de Bolonha forjam irmandades/agremiações a exemplo de outras corporações existentes no período. Portanto, a escola de Bolonha é primitivamente uma universitas scholarium. A universidade de Bolonha gozava de proteção imperial. Frederico Barba-Ruiva, em 1158, confere a Authentica Habita, pela qual outorga proteção àqueles que viajavam à Itália para estudar “...omnibus qui causa studiorum peregrinantur scholaribus...”. (TAMAYO Y SALMORÁN, 2009, p.53). A interpretação jurídica da Habita concedeu aos scholares os mesmos benefícios dos clérigos. Concedeu-lhes tanto aos estudantes de Direito Romano como de Direito Canônico. A Universidade de Bolonha era atrativo para estudantes de toda a Europa, incidindo consideravelmente sobre a economia da cidade. Havia, assim, um comprometimento por parte dos mestres, um pacto no sentido de não irem ensinar em outro lugar. A relação aluno-estudante se modificou, pois o magister se encontrava vinculado à política da comuna fazendo com que os estudantes se insurgissem formando irmandades, que viriam a se agrupar formando a universitas scholarium, a Universidade de Bolonha, que tinha por escopo defender direitos e prerrogativas de seus membros.
A universidade de Bolonha concorreu para que, através dos tempos, se alterassem os rumos da história. Ao lado das duas forças sociais que vinham da Idade Media, a religião e o Império, começou a surgir outra, o studium (ensino universitário). (MEIRA, 2001, p.393).
Era a universitas scholarium uma organização comunitária de estudantes, seccionada por áreas de estudo, e dentro de cada qual por nações. O poder de iniciativa e decisão incumbia aos alunos, que a custeavam. Fruto da associação de antigas escolas leigas de Direito, sobretudo do sul da Europa, comportavam grande contingente de estrangeiros, de que se originaram duas societas ou universitates – a dos Ultramontanos (l. além dos montes, que reunia aqueles que vinham de paises situados além dos Alpes), composta de estudantes não-italianos – e a dos Citramontanos (l. aquém dos montes, que se constituía de estudantes oriundos de várias regiões a Itália. Com o intuito de se fortalecer, os estudantes ameaçavam migrar de Bolonha (cessatio), e o fizeram em 1217, ao cabo de três anos, enfraquecendo a economia local. Seu status corporativo fora reconhecido em 1252-1253, pela comuna e pelo Papa.
A Universidade de Bolonha detém força, mormente, devido ao fato de que seus escolares não eram pessoas despreparadas, mas homens maduros, de inúmeras procedências, sobretudo sacerdotes e jovens oriundos de famílias nobres.
O grande mérito de Bolonha fora o ensino e difusão da ciência jurídica, razão pela qual ficou conhecida, com Irnério à frente, como lucerna iuris, visto que aí se ressuscitam os estudos de Direito Romano. “...E esse direito, sistematizado pelos glosadores e pós-glosadores, alicerçava-se nos preceitos compilados pelo Imperador Justiniano nas Pandectas ou Digesto, no século VI.” (MEIRA, 2001, p.394).
A Irnério, portanto, se deve a recepção e ressurgimento do Direito Romano – Corpus Justinianum. Ele fora quem conferiu autonomia definitiva ao estudo/ensino da Ciência Jurídica. Irnério, mestre em artes liberais (1055-1130), fora considerado o caput scolae, por ser o precursor da Ciência Jurídica no Ocidente medieval. Reuniu e sistematizou as fontes romanas, realizando um estudo cientifico do Direito. Sua formação em artes liberais lhe influenciou; “...o gosto pela gramática, pelos textos e manuscritos antigos contribuíram na dinâmica de ensino.” (MARRAÚ, 2008, p.66). Invitado a lecionar em Bolonha por Matilde, duquesa de Toscana, teve uma tríplice intuição:
a) Dar ao direito um caráter autônomo que a enciclopédia do saber medieval não lhe reconhecia;
b)Estudar o “Direito de Justiniano” nos textos genuínos, fazendo [...] estratos e epítomes;
c) Estabelecer o significado verdadeiro da compilação justinianéia, e levar à prática um ordenado e completo Corpus Juris. (tradução livre). (TAMAYO Y SALMORÁN, 2009, p.31-32)..
É obra dos juristas medievais a formulação de disposições jurídicas, de conceitos abstratos, em virtude da reformulação da compilação justinianéia e sua aplicação paulatina à prática jurídica. Na Escola dos Glosadores, dentre os expoentes mais importantes pode-se citar Azo e Accursio. Com os trabalhos sobretudo de Irnério, os textos jurídicos romanos tornaram-se acessíveis ao estudo profissional do Direito. Surge o Direito então como disciplina autônoma de ensino superior.
Portanto, este período caracteriza-se pela redescoberta dos antigos textos de Direito Romano e a inserção do método dialético na jurisprudência, fazendo surgir a ciência jurídica na Europa. A noção de ordem jurídica, portanto, remonta ao medievo. O Direito ensinado nas universidades não era o direito local, e consuetudinário, mas o direito justinianeu. Daí deriva o caráter supletório do Direito Romano face aos direitos locais. O Direito Romano era reconhecido como o paradigma, o ideal de Direito (ius commune).
Os glosadores foram, portanto, os primeiros a estudar o Direito como ciência. A glosa (g. glvssa = voz) consistia na explicação sintética das palavras de acepção mais obscura. Tal método fazia parte do estudo da gramática no trivium. Os glosadores se detinham essencialmente a interpretações textuais, cingindo-se à mera exegese dos mesmos. Os glosadores, via de regra, inscreviam suas iniciais no fim das glosas. Escreveram comentários sintéticos de Direito Romano – as famosas Summa.
Estudaram basicamente os textos romanos das épocas clássica e bizantina. O ensino se iniciava com um estudo propedêutico, composto de dois ciclos: o trivium (gramática, retórica e dialética) e quadrivium (aritmética, musica, geometria e astronomia). Quem quisesse lograr formação superior em Direito devia antes estudar as artes liberais, razão por que até à atualidade se conhecem os estudiosos das humanidades como “letrados”, em oposição aos iletrados, ou aqueles que não tinham formação em Artes Liberais. Ou seja, a formação na faculdade de Artes era pressuposto para quem queria alçar ao grau em Teologia, Medicina ou Direito. Os elementos de Direito eram portanto ensinados no quadro da retórica e da dialética, com intuito preponderamente prático.
Os cursos eram divididos em ordinários e extraordinários – ordinariae et extraordinariae lecturae. Os cursos ordinários eram considerados extraordinários quando ministrados à tarde. Os cursos ordinários versava sobre os libri ordinarii (Digestum Vetus e Codex Lib. 1-9); e os extraordinários sobre os libri extraordinarii (Infortiatum; Digestum Novum;Volumen- Codex Lib. 10-12, Institutiones, Authenticum e Libri Feudorum).
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