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quarta-feira, 2 de novembro de 2011

ERRO DE TIPO INCRIMINADOR ACIDENTAL

  
Autor: Fernando Carlomagno

Conceitualmente, o erro de tipo incriminador acidental é aquele que vicia a vontade, mas não a exclui. Uma boa denominação para este erro é erro sanável, pois, pode identificar a coisa ou a pessoa cogitada. É o erro que incide sobre os dados acidentais do delito ou sobre a conduta de sua execução. O erro de tipo incriminador  acidental não exclui o dolo e portanto, o agente responderá pelo crime.
              ERROR IN OBJECTO
 ERRO SOBRE O OBJETO
É quando a conduta do agente recai sobre objeto (material), diverso do que gostaria de atingir. É o caso de quem rouba bijuteria acreditando ser jóia ou, simplesmente, quem rouba açúcar acreditando ser farinha. Nos casos descritos anteriormente, à luz do erro de tipo acidental sobre o objeto, não há o maximus da beneficência do réu, pois, de qualquer forma o agente praticou ato ilícito e responderá, assim, normalmente pelo crime descrito no art. 155, caput, CP.

  ERROR IN PERNONA
 ERRO SOBRE A PESSOA 
Está previsto no Art. 20, § 3º, CP.
Aqui ocorre um desvio do curso causal do agente em face do resultado. É quando um agente pretende ofender o sujeito. Exemplificando no mundo fenomênico, um garoto pretende cometer um homicídio contra uma gestante. Quando em atalaia estava e percebendo a aproximação de um vulto, pôs-se a atirar contra este, porém, tardiamente, o agente vem perceber que tinha disparado contra a própria mãe. Neste caso não incidirá a agravante genérica prevista no Art. 61, II, CP, porém, a vítima acaba por incorporar, para efeitos penais, todos os requisitos da vítima pretendida, no caso a gestante (Art. 20, § 3º,  2ª parte). Mais claramente, a mãe passa a ser qualificada como gestante, mesmo não estando grávida. Na mente do agente a vítima contra quem disparou era o que ele realmente gostaria de ofender. Este erro só pode ser aplicado em crimes culposos.
  ABERRATIO ICTUS
             ERRO SOBRE A EXECUÇÃO 
A aberratio ictus caracteriza-se na existência da aberração no ataque ou no desvio de golpe. Dá-se quando a ação ou omissão, pressupondo a intenção criminosa, não recai sobre o objeto desejado, ou recai de modo não adequado, além ou aquém da intenção, sempre sobre bem jurídico idêntico. Este erro acidental na execução recai sobre o erro sobre a pessoa.
Está previsto no:
 Art. 73 do CP - “Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código”.
Não confundir com error in persona, no qual há um erro de representação, uma confusão mental.
Exemplo: O agente dispara contra uma pessoa, erra e certa outra pessoa. O agente, devido à má pontaria, levou esta outra pessoa a óbito. Houve um erro acidental na execução devido a má pontaria do delinqüente. Vale lembrar que o aberratio ictus pode existir com unidade simples (resultado único), na qual o agente responderá por um crime, como se tivesse acertado a pessoa que queria, ou com unidade complexa (resultado duplo), na qual o agente responderá pelo concurso formal de crimes, ou seja, uma só ação produz dois ou mais resultados (art. 70, CP). 
Claro é o entender dos nossos tribunais:
TACRIM-SP, AP. N. 318083-9, 10.ª Câm., Rel. MUNHOZ SOARES, j. 4.4.4, v.u., JUTACRIM, LEX, 80, p. 326.
Erro na execução – Agente que, pretendendo atropelar seu devedor atinge terceiro – Lesão corporal – Condenação – Os arts. 53 e 17, § 3º, segunda parte, do CP, refletem as circunstancias inerentes às qualidades da vítima, e o erro contra esta na execução do crime não isenta de pena o executor uma vez provado o dolo compaginado à figura típica de que se cuida(...).
O comportamento do apelado é o de que, pretendendo atropelar seu devedor, acabou por atropelar terceiro. E tal, como é evidente se insere nas previsões contidas no art. 53, o que a todas as letras, é como se a ação tivesse sido praticada contra Walter Reigota, o devedor. Ficou claramente demonstrado que o aceleramento do veículo se deu quando se encontrava nas proximidades deste último, que saltou, acabando por ser atingido Jurandir Pimentel, a vítima, com a série de escoriações descritas às fls. 23-23 v.

  ABERRATIO CRIMINIS
 RESULTADO DIFERENTE DO PRETENDIDO 
A aberratio criminis ou delict (resultado diverso do pretendido – art. 74 CP) ocorre quando o agente pratica o ato ilícito, porém, por erro ou por acidente, atinge um resultado diferente do que pretendia, e sempre sobre bem jurídico diferente. Esta situação faz com que o agente responda por culpa, desde que o fato esteja previsto como crime culposo.
Exemplo: O agente deseja atingir uma coisa, erra e atinge uma pessoa.
  ABERRATIO CAUSAE
 ERRO SUCESSIVO OU DOLO GERAL 
         Aqui há um erro acidental com relação ao nexo causal.
            O agente acaba por alcançar o resultado pretendido, porém, por uma causa distinta daquela que havia planejado.
            Exemplo: O agente quer matar a vítima por afogamento e para tanto, joga a mesma da ponte, porém, tal pessoa bate a cabeça num poste da ponte e morre por traumatismo craniano. Há um erro acidental quanto ao nexo causal, porém, o agente responderá normalmente pelo delito.
 ERRO DE TIPO PERMISSIVO 
“Dá-se quando o objeto do erro for pressuposto de uma causa de justificação.”[1][7]
 O Código Penal nada diz sobre a exclusão do dolo, mas sim, fala em “isenção de pena” (art. 20, § 1º). Esta isenção refere-se à culpabilidade e não à tipicidade ou ilicitude.
Este erro é uma mistura do erro de tipo com o erro de proibição indireto, sobre o qual discorreremos mais adiante.
No erro de tipo permissivo não há a exclusão do dolo, mas, apenas um afastamento da culpabilidade dolosa e da culpabilidade culposa, se o erro for evitável.
Definitivamente, o erro de tipo incriminador e o erro de tipo permissivo não possuem a mesma natureza e, principalmente, não geram as mesmas conseqüências, pois, como bem explícito por Luiz Flávio Gomes,  numa análise face ao art. 20, CP:
 “se o erro de tipo permissivo fosse da mesma natureza do erro de tipo incriminador, com as mesmas conseqüências jurídicas, concluir-se-ia pela desnecessidade do parágrafo primeiro: bastaria o caput.”[2]8]
  ERRO DETERMINADO POR TERCEIRO
            Este erro está previsto no Art. 20, § 2º, CP.
Pode ser espontâneo ou provocado.
O “provocado” pode ser por determinação dolosa ou culposa.
A dolosa se dá quando o agente conscientemente induz outra pessoa a erro.
Exemplo: Um sujeito B quer matar o sujeito C e, o sujeito B (no caso o terceiro) dá uma pistola para A fazendo este crer que a arma está descarregada. O sujeito A dispara contra C, subtraindo-lhe a vida. O sujeito que entregou a arma, isto é, o sujeito B responderá por crime doloso, enquanto o sujeito provocado, isto é, o sujeito A em face de seu erro, salvo se agiu com culpa, não responde pelo crime.
A culposa, por sua vez, se dá quando o agente, por culpa, leva outra pessoa a erro.
Exemplo: O sujeito B, sem saber se a pistola está munida ou não, entrega a arma para o sujeito A e o induz a disparar contra C. Neste caso o sujeito A e o sujeito B respondem por crime culposo, pois, agiram ambos com imprudência. Sinteticamente, se o erro for inevitável não se constitui crime, porém, se o erro for evitável, responderá por crime culposo, havendo previsão legal.
            O “espontâneo” é o erro cometido pelo terceiro inocente. O sujeito incide em erro sem a participação provocadora do terceiro.
  ERRO DE PROIBIÇÃO
Normatizado no direito penal brasileiro pelo Art. 21 do CP, o erro de proibição é erro do agente que acredita ser sua conduta admissível no direito, quando, na verdade ela é proibida. Sem discussão, o autor, aqui, sabe o que tipicamente faz, porém, desconhece sua ilegalidade. Concluímos, então, que o erro de proibição recai sobre a consciência de ilicitude do fato.
O erro de proibição é um juízo contrário aos preceitos emanados pela sociedade, que chegam ao conhecimento de outrem na forma de usos e costumes, da escolaridade, da tradição, família, etc.
No erro de proibição, o erro se diferencia da ignorância ou da má compreensão legal. Pode-se ignorar a lei e ao mesmo tempo conhecer a norma.
 FORMAS DE ERRO DE PROIBIÇÃO
  ERRO DE PROIBIÇÃO DIRETO
Este erro abrange a situação do autor desconhecer a existência da norma proibitiva, ou, se o conhecimento obtiver, considera a norma não vigente ou a interpreta de forma errônea, conseqüentemente, não reputa aplicável a norma proibitiva.
  ERRO DE PROIBIÇÃO INDIRETO
Neste caso, o autor possui o conhecimento da existência da norma proibitiva, porém acredita que, em caso concreto, existe uma causa que, justificada em juízo, autoriza a conduta típica.
 Nas palavras de Luiz Flavio Gomes:
 “por erro que concorre uma norma justificante, por desconhecer os limites jurídicos de uma causa de justificação admitida ou supor a seu favor uma causa de justificação não acolhida pelo ordenamento jurídico”.[3]
  ERRO DE PROIBIÇÃO ESCUSÁVEL
Aqui não se deve reprovar a conduta do autor, pois, este não se encontra em situação de conhecimento do injusto do fato. Sendo assim, o erro de proibição invencível deve ser, sempre, desculpável. Trata do assunto o Art. 21 do nosso CP: “O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta a pena”.
Clara é a jurisprudência neste sentido:
TJSP, Ap. 41253-3, 3.ª Câm., Rel. GENTIL LEITE, j. 30.12.85, v.u., RT 610/335.
Casa de prostituição – “Drive-in” – Local não destinado especificamente a encontros para fins de prostituição – Fiscalização do mesmo pela Polícia – Licença de funcionamento fornecida pela Prefeitura local e placa proibindo a entrada de menores – Erro sobre a ilicitude do fato, portanto, acolhido – Absolvição decretada – Inteligência dos arts. 229 e 21 (redação da Lei 7.209/84) do CP.
Para a caracterização do delito previsto no art. 229 do CP de 1940 é necessário que se demonstre que o “drive-in” tenha sido desvirtuado para lugar destinado à prostituição.

  ERRO DE PROIBIÇÃO INESCUSÁVEL
Neste caso, o agente também desconhece o injusto do fato, porém, possui por completo a condição de chegar à consciência da ilicitude do fato por conta própria. Aqui o agente responde pelo crime doloso e há somente a possibilidade de atenuação da pena, conforme o Art. 21, 3ª parte, CP:  “(...)se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço”.



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