Tatiane Sander
Quando a incapacidade cessa por expressa determinação legal, diz-se que se trata de emancipação legal.
A emancipação voluntária dá-se por concessão de ambos os pais, ou por sentença do juiz.
É ato unilateral de ambos os pais, que declaram estar o filho maior de dezesseis e menor de dezoito anos de idade apto para exercer todo e qualquer ato da vida civil, regendo plenamente sua pessoa e bens. Para a existência, validade e eficácia do ato da emancipação, não há necessidade de sua homologação pelo juiz.
Diferentemente do sistema do Código Civil de 1916, a escritura pública é forma solene exigida pelo legislador (CC 5º I c/c 107) e, como tal, impõe que a concessão dos pais para a emancipação dos filhos seja feita por escritura pública, devendo seguir os ditames elencados no caput e nos parágrafos do Artigo 215 do Código Civil Brasileiro, sob pena de nulidade (CC 166 IV).
O artigo 5º parágrafo único do novo Código Civil estabelece as causas que cessam a incapacidade civil. O inciso I deste artigo prevê que esta incapacidade cessa por concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público.
Necessário lembrar que, o poder familiar sobre os filhos menores, conforme artigo 1630 e 1631 e parágrafo único do Código Civil combinado com o artigo 226, parágrafo 5º da CF, é exercido em conjunto pelo pai e pela mãe. Não constando do assento de nascimento o nome do pai do menor, a emancipação pode ser concedida exclusivamente pela mãe; se a mãe não for conhecida ou capaz de exercer o poder familiar, será dado tutor ao menor (CC 1633).
Havendo desacordo entre os pais, quanto a dever ser concedida ou não a emancipação do filho, é assegurado a qualquer um deles recorrer ao juiz para a solução do desacordo, hipótese em que, se for o caso, a emancipação será concedida por sentença do juiz, em procedimento de jurisdição voluntária.
Como podemos vislumbrar, a norma trata de “ato de concessão dos pais”, eis que não exige a intervenção do filho emancipado para o aperfeiçoamento e validade do ato de emancipação.
Entendemos, contudo, para que não se coloque em dúvida a intenção dos pais, nem se alegue que a emancipação está sendo feita para que os pais se livrem da obrigação de sustento do filho (apesar de ele poder requerer alimentos dos pais), é conveniente que o filho emancipado participe do ato, concordando, ou seja, como anuente.
A dúvida, no âmbito da emancipação, surge quando um dos pais está em lugar incerto e não sabido e apenas um deles presta a assistência à criança. Desta forma, pode o menor ser emancipado por escritura pública, apenas na presença de um dos pais?
O Inciso I, do parágrafo único do artigo 5º do Código Civil prevê que cessará a incapacidade, para os menores, “pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro ...”.
Desta feita, ao nosso ver é possível que se conceda a emancipação por um dos pais na ausência do outro, pois, o legislador foi muito claro na letra da lei, como vimos no artigo citado anteriormente, autorizando esta emancipação.
A confusão está justamente no termo "falta". Qual a interpretação a ser dada a este termo?
Ora, a falta citada neste artigo não pode ser a morte, pois, a morte por si só já extingue o poder familiar, ficando o mesmo a cargo do outro progenitor e, se o legislador quisesse se referir à morte, teria feito expressamente.
Igualmente não pode ser considerada a ausência declarada, bem como a morte presumida, pois, se assim o fosse ,com certeza, o próprio legislador descreveria no texto legal.
Entendemos, portanto que a "falta", a que se refere o artigo, é tão somente o abandono do pai ou da mãe para com seu filho, a dificuldade de localização dos mesmos, ou ainda, estando eles em local incerto e não sabido.
Seria muito simples, para não abrir precedentes à discussão, estipular que a emancipação se dá por ambos os pais e na falta de um, por autorização judicial, mas não é isso que foi regrado no nosso ordenamento jurídico.
Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery, Maria Helena Diniz, entre outros autores, firmaram entendimento no sentido de que na falta de um dos pais, não pode ser concedida a emancipação apenas pelo outro, apenas por decisão judicial.
Isso é baseado no fato de que, segundo eles, mesmo distante o pai, não perde o poder familiar. Para fortalecer este pensamento, como já explicitado anteriormente, recorrem aos artigos 1630 e 1631, parágrafo único, do Código civil, que estabelecem que os filhos estão sujeitos ao poder familiar enquanto menores, e que compete aos pais exercê-lo e, quando houver divergência, pode-se recorrer ao juiz para a solução do desacordo.
Aqueles que defendem a necessidade de decisão judicial para emancipar-se o menor quando da ausência de um dos pais afirmam que é preciso recorrer ao juízo para obter essa decisão.
Discordamos, pois, o próprio artigo 1631, no caput, estabelece que “o poder familiar compete aos pais, e na falta ou impedimento de um deles, o outro exercerá com exclusividade”.
Mais uma vez estamos diante do termo "falta", mas aqui existe uma sutil diferença, pois, dá ao pai presente, a possibilidade de exercer o poder familiar com exclusividade. O parágrafo único deste mesmo artigo, como vimos anteriormente, fala na possibilidade de recurso ao juízo quando houver divergência entre os pais no exercício do poder familiar. No caso em pauta, não existe qualquer divergência entre os pais, existe sim, a falta ou abandono de um dos pais e o exercício exclusivo do poder familiar pelo outro. Portanto, cai por terra a base defendida por tais autores.
Além disso, o artigo 1638, inciso II, do Código Civil, estabelece que perderá o poder familiar o pai ou a mãe que deixar o filho em abandono. Se o pai ou a mãe está em lugar incerto e não sabido, é lógico que não mantém contato com seu filho, restando evidenciado que o deixou abandonado, mesmo que aos cuidados do outro progenitor, que passa a exercer o poder familiar com exclusividade.
Por todos motivos aqui citados, nos parece claro que a intenção do legislador foi resguardar o direito do menor, protegendo-o daquele pai relapso e irresponsável, dando a possibilidade ao progenitor que acompanha o crescimento e criação do filho à conceder-lhe a sua emancipação por escritura pública.
Reafirmamos nosso entendimento no sentido de que basta, apenas, a declaração de um dos pais na escritura pública de emancipação, de que o outro está em lugar incerto e não sabido.
Entendemos ainda, que no instrumento público de emancipação, é necessário que o notário exija a presença de duas testemunhas, para subscrever o ato e, que conheçam o menor e o genitor que comparece para emancipá-lo, e que atestem, pelo seu conhecimento, a falta do outro genitor faltoso, imputando responsabilidade solidária pelo teor da declaração.
Por fim, a escritura pública de emancipação, depois de lavrada e assinada pelas partes e pelo notário, ou seu substituto legal, tem de ser registrada no cartório de registro civil, à margem do assento de nascimento (LRP 29 IV, 89 e 90)
Concluímos, com este breve estudo feito do artigo 5º, parágrafo único, inciso I, do Código civil Brasileiro, que, pelos fundamentos apresentados, nada impede a um dos pais, quando o outro estiver em local incerto e não sabido, conceder a emancipação voluntária, ao filho com dezesseis anos completos, desde que declarada esta falta, na própria escritura pública e subscrita por duas testemunhas capazes.
Referências Bibliográficas:
DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. Atualizado de acordo com o Novo Código Civil (lei n. 10.406, de 10.1.2002). 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
NERY JÚNIOR, Nelson.; NERY, Rosa Maria Andrade da. Código Civil Comentado e legislação extravagante: atualizado até 02.05.2003. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
NOVO Código Civil Brasileiro (Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002). Estudo comparativo com o Código Civil de 1916. Prefácio do Prof. Miguel Reale. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
SILVA, Caio Mário Pereira da. Instituições de Direito Civil - Direito de Família., 14ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2004. v. V
SILVA, de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 22ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2003.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil - Direito de Família, 3ª ed. São Paulo: editora Atlas, 2003. v. 6.
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