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terça-feira, 10 de maio de 2011

JUSTIÇA GRATUITA

Autor: Newton Freitas
A Lei nº 1.060, de 05 fev. 1950, estabelece normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados.
Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família, na forma do parágrafo único do art. 2º.
Para gozar dos benefícios da assistência judiciária, basta a parte requerente incluir, na própria petição inicial, simples afirmação de não estar em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família, de acordo com o ´caput´ do art. 4º. Quem afirma essa condição presume-se POBRE, até prova em contrário, acrescenta o § 1º do art. 4º.
No Brasil, segundo o IBGE, para caracterizar se um indivíduo é POBRE ou não, a metodologia oficial usa como referência o salário mínimo familiar, e é considerada pobre a família com renda abaixo de ½ do salário mínimo; é considerada extremamente pobre (indigente) a família com renda abaixo de ¼ do salário mínimo.
Ainda segundo o IBGE, com base em 2003, o rendimento médio familiar ´per capita´ é de 0,4 salário mínimo para os 40% mais pobres e de 8,7 salários mínimos para os 10% mais ricos (´Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – 2003´ do IBGE).
O rendimento familiar ´per capita´ é de até ½ salário mínimo para 31,1% das famílias (casal com filhos); mais de ½ a 1 salário mínimo para 26,5% das famílias; mais de 1 a 2 salários mínimos para 21,8% das famílias; mais 2 a 3 salários mínimos para 8,0% das famílias; mais de 3 a 5 salários mínimos para 6,1% das famílias; e mais de 5 salários para 5,0% das famílias (´Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – 2003´ do IBGE).
Apenas 0,9% das pessoas ocupadas ganham mais de 20 salários mínimos; apenas 2,8%, mais de 10 a 20 salários mínimos; apenas 6,6%, mais de 5 a 10 salários mínimos; apenas 10,9%, mais de 3 a 5 salários mínimos; apenas 10,1%, mais de 2 a 3 salários mínimos; por outro lado, 28,5% das pessoas ocupadas ganham mais de 1 a 2 salários mínimos; 18,4%, mais ½ a 1 salário mínimo; e 9,2%, até ½ salário mínimo (´Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – 2003 - projeção para 2004´ do IBGE).
O escopo da gratuidade é elevado. O objetivo é permitir ao cidadão sem recursos a defesa de seus direitos, como assinala o desembargador Sídenham Ribeiro:
“Justiça gratuita. Não é possível transformar o favor legal em fonte de abusos, para o beneficiado castigar o seu adversário, quando tão elevado é o seu escopo, amparando os que precisam defender judicialmente os seus direitos e não dispõem de recursos.” (Ac. un. da 21 Câm. do TJRJ, no Ag. 1.1 12, Rei. Des. Sídenham Ribeiro, Boletim Judicial, 38:232).
Infelizmente, o favor legal da gratuidade vem sendo fonte de abusos. Embora dispensem o defensor público e indiquem seu advogado, litigantes situados no rol dos 10% mais ricos postulam e ganham o favor legal. Esses litigantes solicitam a prestação jurisdicional não para proteger direitos, mas para postergarem o pagamento de dívida, e o objetivo do favor legal não é precipuamente a isenção do pagamento das custas, mas se eximirem do pagamento dos honorários advocatícios. Sabem não ter o direito a defender.
O Direito é articulado não como instrumento de justiça. O Judiciário é acionado não para resolver uma interferência entre direito subjetivo e obrigação (´suum cuique´), mas como meio de protelar o pagamento de dívida, em decorrência da morosidade processual, e uma das causas do congestionamento do Judiciário é justamente o acúmulo de processos repetitivos ou processos de maus pagadores, sob o estímulo da gratuidade da Justiça.
Fora do alcance do princípio da sucumbência (sanção sobre a conduta inadequada), vale dizer, sem nenhum risco a sopesar, os maus devedores, como autores, praticam litigância irresponsável com danos não só para o réu como, também, para os bons devedores (aumento do risco de crédito) e para a sociedade em geral, em razão da sobrecarga imposta ao Judiciário, com custo para o Estado.
Os magistrados, como bons conhecedores dos fatos na vida social, poderiam utilizar parâmetros mais objetivos, como os dados do IBGE sobre a classe de rendimentos, para decidirem sobre a concessão da gratuidade.
O espírito do instituto da gratuidade não é favorecer as pessoas com o nível de renda dos 10% mais ricos. Se alegam falta de condições, por certo não sabem vencer a tentação da contínua necessidade, e a Justiça não pode premiar essas pessoas, criadoras de necessidades aparentes, efêmeras e artificiais, cada vez mais afastadas do real sentido da vida.
A Lei nº 12.381, de 09 dez. 1994, do Estado do Ceará, em seu art. 10, VII, limita a gratuidade da Justiça à parte representada pela Defensoria Pública, e a parte só poderá indicar advogado no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local de prestação do serviço. Dispõe o art. 10, VII, da referida Lei:
´São isentos do pagamento de custas: ... VII – o beneficiário da justiça gratuita, que esteja representado por advogado por ele indicado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço;´
Justiça, em sentido amplo, é tarefa cotidiana de todos os cidadãos e responsabilidade do convívio social, afirma Ellen Gracie, presidente do STF.
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
O benefício da assistência judiciária pode ser concedido à vista de simples afirmação de pobreza da parte requerente, sem comprovação do estado de miserabilidade, mas o julgador poderá indeferir o pedido diante de elementos disponíveis em contrário, na forma do art. 4º, § 1º, da Lei nº 1.060, de 05 fev. 1950 (AgRg no AG 640391, julgado em 03 nov. 2005, rel. ministro Barros Monteiro).
Nos termos do art. 4º da Lei nº 1.060, de 1950, a parte requerente gozará dos benefícios da assistência judiciária mediante simples afirmação de não estar em condições de pagar as custas do processo e os honorários do advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família; a concessão da gratuidade da justiça pode ser reconhecida em qualquer fase do processo, e é suficiente a mera afirmação do estado de hipossuficiência (Resp 400791, julgado em 02 fev. 2006, rel. ministro Francisco Peçanha Martins).
A parte vencida, quando beneficiária da justiça gratuita, sujeita-se ao princípio da sucumbência, incluindo o pagamento de verba honorária, a ser suspenso por cinco anos ou enquanto perdurar o estado de miserabilidade (Resp 709249, julgado em 02 fev. 2006, rel. ministro Francisco Peçanha Martins).
Cabe ao juiz avaliar a pertinência das alegações da parte requerente e deferir ou não o pedido de assistência judiciária gratuita; a declaração de pobreza implica simples presunção ´juris tantum´, suscetível de ser elidida mediante prova em contrário (RMS 20590, julgado em 16 fev. 2006, rel. ministro Castro Filho).
Basta à postulação da assistência judiciária a apresentação de petição ao juiz da causa, sem necessidade de sua instrução com declaração de pobreza pelo requerente; a postulação deve ser deferida inexistindo elementos incompatíveis com a pretensão ou inexistindo impugnação da parte adversa (Resp 655687, julgado em 14 mar. 2006, rel. ministro Aldir Passarinho Júnior).
Para o pedido de assistência judiciária basta a apresentação de requerimento ao juiz da causa, sem necessidade de maior instrução, mas o pedido pode vir a ser indeferido se dos elementos constantes do processo, ou trazidos pela parte adversa em impugnação, for possível concluir não corresponder à realidade a alegação de pobreza (Resp 654748, julgado em 14 mar. 2006, rel. ministro Aldir Passarinho Júnior).
A concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita não se condiciona à prova do estado de pobreza do requerente, mas tão-somente à mera afirmação desse estado, e é irrelevante o fato de o pedido haver sido formulado na petição inicial ou no curso do processo (AGEDAG 728657, julgado em 06 abr. 2006, rel. ministra Nancy Andrighi).
Não há divergência no STJ quanto à possibilidade de extensão da assistência judiciária gratuita às pessoas jurídicas, mesmo aquelas com fins lucrativos, uma vez haja a necessária comprovação da impossibilidade de arcar com as custas e despesas do processo, afirma o ministro Hélio Quaglia Barbosa (Resp 599525, julgado em 17 maio 2007).

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