O jus postulandi é a possibilidade de uma pessoa ingressar em juízo sem a assistência do profissional advogado, nunca entendi bem esse procedimento concedido ao cidadão afim de que possa por si atuar em juízo sem o auxílio do advogado. Esta prática é mais adotada na área trabalhista e também recentemente nos chamados juizados especiais. Sem dúvida a primeira vista permite acesso a justiça ao cidadão pobre sem meios financeiros para contratar um advogado, contudo o que se percebe no dia a dia nosso nos fóruns é que essa prática figura apenas no papel, não atingindo os objetivos que deveria perseguir.
Mesmo no processo trabalhista, processo menos formalista, verifica-se que na pratica a figura do jus postulandi se encontra prejudicado assim que não se formalizar um acordo, ou conciliação logo na audiência inicial. Quando há resistência das parte a uma conciliação, começa a desaparecer o tal jus postulandi, porque o trabalhador sem cultura jurídica, fica despreparado para dar continuidade a sua pretensão ante a astucia da parte reclamada, correndo portanto o trabalhador um sério risco de ver a sua demanda trabalhista prejudicada. Tanto isso é verdade que as vezes vejo o juiz se desdobrar, fazendo vez de advogado no sentido de não ver o trabalhador sofrer prejuízos maiores.
O jus postulando está assim condenado a desaparecer ou permanecer uma figura meramente decorativa, porque sem nenhum utilidade ou praticidade, servindo para esquentar debates de círculos acadêmicos, sobre se é necessário ou não a figura do jus postulandi. Ao permanecer intocável, o jus postulandi revela nitidamente o quanto o povo anda longe da justiça, pois ante a complexidade das regras processuais, que as vezes até o próprio advogado se perde, é deveras demagógico continuar a defender um instituto absoleto que não reflete a realidade.
Sem dúvida o acesso do povo a justiça se realizará através da organização de uma defensória pública, nos termos da constituição federal, com advogados pagos pelo erário público e promovendo a defesa dos interesses da população carente. Está previsto na Constituição em vigor a criação da defensória pública, tanto a nível federal, como a nível dos estados. Em alguns estados, a defensória pública já é uma realidade, em outros ela está em formação e em outros nem se ouve falar. O Governo federal preocupado com a desasistência ao pobre, está organizando um concurso para preencher esse lapso, formando seu quadro de defensores públicos, já era tempo, espera-se que o exemplo seja seguido permitindo o acesso a justiça do povo.
Somos testemunho vivo dessa falta de assistência jurídica ao pobre cidadão e também da inutilidade do tal jus postulandi. Estamos acompanhando processos que nos chegaram após a parte interessada ter ingressado em juízo sem assistência de advogado, passado o primeiro momento, desilude-se o pobre cidadão e procura socorro no advogado próximo, quando é preciso formular um recurso ou qualquer outra diligência, ai não há como evitar o advogado. Nesse instante percebe-se que não adiantou muito ter o cidadão ingressado sozinho em juízo, na medida em que na maior parte das vezes a pretensão é mal deduzida em juízo, não conseguiu o pobre cidadão ante o funcionário da justiça que o recebeu formular corretamente seu pedido, desprovido de qualquer técnica jurídica. Imagine só se o advogado que suponha-se conhece o Direito, tem as vezes dificuldades na formulação em juízo da pretensão de seu constituinte, que dizer de alguém que ainda não se formou, não é advogado.
Eu creio sinceramente que o jus postulandi , em vez de prestar serviço ao povo, lhe presta desserviço, pois se doutrinariamente o jus postulandi é indiscutível, na pratica ele não preenche os objetivos esperados no sentido de fazer com que o povo tenha acesso à Justiça. Na realidade no plano prático não se pode sequer falar de jus postulandi porque ele não existe pelos motivos acima expostos. Ao permanecer as coisas do jeito estão, nada mudará tão cedo quanto ao acesso do povo a Justiça. Cada dia que passa observe-se essa verdade o povo anda muito afastado da justiça, chegando-se até a dizer que no país só vai para a cadeia quem é pobre. Isto num certo sentido não deixa de ser verdade, hoje em dia é preciso ter dinheiro, para poder ter uma boa asessória jurídica permitindo se livrar de qualquer situação incomoda.
O JUS POSTULANDI ANTE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL
A partir da Constituição de 1988, o advogado conquistou uma posição de destaque no quadro da Administração da Justiça. Reza a norma constitucional que o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei (art.133).Os constituintes agiram corretamente, pressentindo a importância dessa personagem para o bom andamento da Justiça. Não é que o advogado seja o mais importante entre todos aqueles que contribuem para a distribuição da Justiça, mas sem dúvida é a mola mestra que move a “maquina justiça”, a ponte entre o povo e a justiça. Somente o advogado sente na pele o sofrimento daqueles que têm sede da justiça, podemos dizer ainda que o advogado é a porta de entrada para se ter acesso a “mãe justiça”. Houve assim por bem a Constituição de 1988 homenageá-lo, cercando-o de garantia constitucional permitindo o bom desenvolvimento de suas tarefas.
Essa conquista do advogado nem sempre reconhecida até por certas autoridades, na medida em que varias vezes se presenceia o quanto o advogado não “famoso” sofre na condução das questões que lhe são entregue, enfrentando até desrespeito de sua pessoa como causídico. O advogado é mal recebido nos cartórios, um entendimento as vezes que deixa a desejar, é visto não como um sério colaborador da justiça, mas um “chato”, quando tenta se fazer respeitar. Quando exige que seja tratado com dignidade, a coisa em vez de melhorar, piora de seu lado, pois esta atitude pode lhe causar sérios transtornos, quando chega num cartório em que antes tenha se pronunciado sobre o péssimo atendimento é ignorado e não tem a quem recorrer. Reclamar a OAB seria uma solução, mas isso adianta? A OAB não vai acomapanhá-lo todo dia que precisa se deslocar até o fórum acompanhar seus processos.
Não bastasse o absurdo que reina na Justiça do Trabalho, teimando em continuar a desrespeitar a constituição federal admitindo o Jus Postulandi, quando na realidade como se tentou mostrar, isto é uma aberração, vez que em vez de ajudar o povo a acesso a justiça, só faz confundi-lo. Temos a Lei nº.9.099/95 que também vem sacramentar que nas causas até 20 ( vinte) salários mínimos, o cidadão não precisa de advogado para ingressar com uma ação nos juizados especiais. Voltamos a repetir o que já foi dito alhures: O jus Postulandi só é possível quando num primeiro momento as partes decidem acordar. Se não se realizar o acordo, não há dúvida que o cidadão pobre que não tem a devida assistência jurídica, começa logo a ver seu direito minguar.
Tem-se assistido, varias vezes, o juiz que deveria permanecer neutro na relação processual, pois é o julgador , se tornar advogado da parte que não veio acompanhado de causídico. Pondo de lado a sua neutralidade, ajuda o cidadão desacompanhado de advogado a produzir a sua defesa, orientando-o sobre o que fazer. Isto as vezes leva o juiz a perder um tempo enorme, atrasando a pauta e prejudicando de uma certa maneira todo mundo. Na área trabalhista isto é comum, o que a nossa ver não deveria acontecer pois perturba verdadeiramente os trabalhos na vara e prejudica demasiadamente os causídicos que são obrigados a suportar longas esperas, perdendo as vezes todo um dia devido ao atraso registrado na pauta das audiências.
Alguns afirmam que a indispensabilidade do profissional advogado para o ingresso do cidadão na justiça é apenas para garantir trabalho ao advogado. Na realidade vendo bem as coisas percebe que não é bem assim. A constituição ao sacramentar tal assunto nos seus dispositivos, não há dúvida que o fez para garantir ao cidadão a plenitude de seu direitos. De maneira que soam falsas qualquer ataque a tal situação. Pois a prática , a experiência têm revelado que a presença do profissional advogado nas lides forenses tem evitado prejuízos aos litigantes num processo. Portanto aqui não se trata de garantia de emprego para o empregado, mas sim da correta aplicação da justiça.
Costumo brindar meus interlocutores a respeito do assunto, com a seguinte historinha: Fui contratado por um cliente para acompanhai-lo numa audiência. Quando lá chegamos o meu cliente foi chamado pelo magistrado, ignorando-se minha presença. Ainda insisti para acompanhá-lo. Todavia o acesso ao recinto me foi negado. Pouco tempo depois, me aparece o cliente dizendo que tinha sido aconselhado a me despedir, pois disseram-lhe que não se precisava de advogados. Que o magistrado resolveria tudo entre as partes. E lá fui eu tendo perdido o cliente. Algum tempo depois, não se passaram sequer 03 ( três) meses, explodiu um escândalo envolvendo tal autoridade acerca de maracutaias que foram descobertos. Aí relacionando as coisas, de repente tudo ficou claro. Onde se nega a presença de um causídico, algo está errado...Certamente não há de se esperar idoneidade ou algo parecido.
A INDISPENSABILIDADE DO PROFISSIONAL ADVOGADO
Pode-se afirmar e sem medo de ser contrariado que o profissional advogado, a imagem do magistrado, do promotor desempenha um papel de extrema importância na solução das lides que são submetidos ao judiciário. Não há uma verdadeira justiça sem esse profissional. Claro que falamos do advogado no verdadeiro sentido, ou seja, aquele profissional advogado, que atuando com ética tem como missão salvaguardar os interesses de seu cliente. Isto sem rabo preso, sem negociatas de corredores que muitas vezes objetivam trair o constituinte, vendendo-se o advogado e furtando-se o advogado a sua sagrada missão de bem defender o seu constituinte.
O advogado consciente de sua missão, é a ponte segura da realização da justiça. É o caminho que leva a harmonia e paz social. É um bálsamo, o copo de água gelado servido a quem tem sede num dia calorento. Não se pode dizer o mesmo do advogado inconsciente de sua missão. Na realidade só defende seus próprios interesses. É pior que o ladrãozinho de esquina, não dispõe de nenhuma dignidade e portanto de profissional de direito só tem o nome. Ele não tem compromisso com o direito, tampouco com a justiça. É um elemento perigoso para o sociedade. Nada constrói, nada acrescenta. Infelizmente profissionais desse calibre são em grande número e aproveitam-se da pouco vigilância, do analfabetismo que reina no meio popular para dar vazo a seus instintos de malfeitores de colarinho branco.
Não há absolutamente nada, nem lei que possa afastar o advogado da relação processual, não importando aqui o valor a ser estipulado para o ingresso do cidadão na justiça sem assistência do profissional advogado. Simplesmente se estará legislando contra os interesses da cidadania. O certo é que não se tira trabalho ou cliente ao advogado, mas sim prejudicando o pobre cidadão, que deixa assim de exercer plenamente a sua cidadania. Dessa forma agredindo a Constituição Federal. É sem dúvida um tremendo desserviço que se presta ao tão sofrido e desamparado cidadão nacional. Todo santo dia assiste-se a essa falta de proteção, sendo que em vez de melhorarem as coisas do lado da cidadania, ao contrário, tudo tende a piorar. Se como assinalado acima o poder bancário conseguir seus intuitos fugindo do domínio do Código do Consumidor, mas uma vez assiste-se a um golpe perpetuado contra a cidadania.
Para finalizar, afirme-se que o jus postulandi é instituto possível, se existir um quadro de defensores públicos suficientes para amparar o cidadão na suas reivindicações judiciais. Senão, não se pode falar do jus postulandi no sentido amplo, porque inexistente. Sendo certo uma tentativa de se permitir o acesso da justiça ao pobre, todavia uma tentativa bastante tímida, pois não alcance plenamente objetivos esperados.
Natal/RN, 25 de janeiro de 2002.
Nenhum comentário:
Postar um comentário